
Direito Condominial - Suse Paula Duarte Cruz Kleiber
advogada especialista em direito condominial e tem vasta experiência no segmento. Atua na área há mais de 20 anos. Além disso, é consultora jurídica, palestrante, membro efetivo da Comissão de Direito Processual Civil da OAB-SP, subseção Santana e de Direito Imobiliário e Urbanístico de Osasco/SP e Jundiaí/SP. Autora do livro "Respostas às 120 dúvidas mais frequentes em matéria condominial" (Editora Autografia, 2017); e coautora do livro "Direito Processual Civil Constitucionalizado (Editora Instituto Memória, 2020); e coautora e coordenadora do livro "Direito Condominial Contemporâneo" (Editora LiberArs, 2020).
Meu condomínio será afetado pela Lei Geral de Proteção de Dados?

Entrou em vigor no dia 18/09/2020, a Lei 13.709/2018, Lei Geral de Proteção de Dados, a “LGPD”. A pioneira legislação a tratar da proteção de dados foi a europeia e com a globalização e troca frenética de informações e trânsito de dados, houve a necessidade de protegê-los, afinal, são eles que, de certo modo, movimentam o mercado. A proteção de dados é o meio eficaz para trazer investidores e então, o Brasil criou a LGPD, cuja vigência estava prevista para o mês de agosto desse ano, mas por força da pandemia acabou por ser adiada e entrou em vigor no dia 18/09, como dito.
É a proteção aos dados dos cidadãos que foi regulamentada por tal legislação brasileira, uma vez que nós já protegíamos a privacidade consoante artigos contidos na Constituição Federal, Código Civil e pelo Pacto San Jose de Costa Rica.
Quem faz captação, coleta, recepção, armazenamento, produção, guarda e eliminação, pratica o “tratamento” desses dados e, portanto, deverá se sujeitar a LGPD.
Pois bem! E no que meu condomínio será afetado?
Farei breve explanação sobre os condomínios para que possamos analisar melhor a nova legislação.
O condomínio é caracterizado pela mescla de propriedade comum e privada. Tem natureza jurídica anômala. É um ente despersonalizado, portanto, é desprovido de personalidade jurídica plena.
E o condomínio não está no rol do artigo 44 do Código Civil, o qual, elenca as pessoas jurídicas, portanto, não pode ser considerado pessoa jurídica na sua plenitude, embora, pratique atos inerentes a elas como registrar funcionários, recolher encargos e impostos etc.
Os artigos 1º e 3º. [1]. da LGPD preveem que ela será aplicada às pessoas naturais e as pessoas jurídicas de direito público e privado. Por sua vez, o artigo 4º.[2], diz onde ela não incidirá: “para pessoas naturais que coletam dados para fins particulares e não econômicos.”
Bom, como vimos o condomínio não é pessoa jurídica e muito menos pessoa natural e por isso a LGPD não o afetará?
Como acontece com a maioria das legislações brasileiras, a resposta é: não é bem assim.
Primeiramente convém dizer que as administradoras, imobiliárias, condomínios shopping centers e comerciais, síndicos profissionais, não há dúvida de que deverão adequar-se à ela, ainda que os condomínios não sejam citados expressamente pela LGPD.
Já nos condomínios residenciais o impacto será menor, mas não penso que deixará de incidir, principalmente para os condomínios residenciais de grande porte onde há “operação de tratamento”, as coletas de vários dados, inclusive os conceituados pela LGPD como “sensíveis” (imagem, biometria etc). Os dados coletados nos condomínios devem ser protegidos e seus funcionários treinados para responderem às indagações de seus condôminos, visitantes, prestadores de serviços, dentre outros. Há de se saber esclarecer a real necessidade, a finalidade, a forma de eliminação etc, dos dados coletados visando obter a autorização do titular deles, conforme princípios constantes do artigo 6º. da LGPD, quais sejam: “finalidade, adequação, necessidade, livre acesso, qualidade, transparência, segurança, prevenção, não discriminação e responsabilização”.
O cidadão passou a ter mais força sobre o controle dos seus dados, podendo indagar além do porquê da coleta de determinados dados, também, se uma empresa detém informações suas e exigir que elas sejam apagadas, conforme prevê o artigo 18 da LGPD. Não me parece razoável que nos tempos atuais, condomínios residenciais descuidem da proteção dos dados coletados, até porque a LGPD em seu artigo 39, prevê a responsabilidade solidária entre todos que coletam e guardam os dados (operador, controlador), portanto, toda a “cadeia”, desde quem determina a captação dos dados a quem os arquiva, poderá ser responsabilizada caso venha a causar danos a alguém.
Por fim, devo dizer que a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), autarquia ligada ao Ministério da Justiça já aprovada e não instituída deverá regulamentar essas situações que carecem de respostas e será a responsável pela fiscalização e aplicação das penalidades que terão incidência a partir de agosto de 2021.
Os condomínios carecem de profissionais diversos, é multidisciplinar, precisa de arquitetos, engenheiros, advogados, administradores e agora também de técnicos em informações, empresas de operação de tratamento de dados, visando dar proteção e segurança aos dados coletados contra vazamentos e má utilização deles.
Portanto, o recomendável é que os condomínios se organizem buscando informações para se adequarem à nova legislação, afinal, o mundo “virtual” veio para ficar, as assembleias feitas dessa maneira são uma das inúmeras demonstrações de que o futuro está muito mais próximo do que possamos imaginar.
* Suse Paula Duarte Cruz Kleiber. Advogada, consultora jurídica condominial, palestrante, especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD); autora do livro "Respostas às 120 dúvidas mais frequentes em matéria condominial" (Editora Autografia, 2017) e coautora do livro "Direito Processual Civil Constitucionalizado (Editora Instituto Memória, 2020); coautora e organizadora do livro “Direito Condominial Contemporâneo” (Editora Liberars, 2020), colunista da revista Direcional Condomínios, Papo Condominial -ES, certificação no curso de administração condominial – módulos I e II - pelo Secovi/SP e vários outros cursos realizados e artigos publicados na área condominial e imobiliária, membro efetivo da Coordenadoria de Direito Condominial da OAB-SP, Comissão de Direito Processual Civil e de Direito Imobiliário Condominial, ambas da OAB-SP, subseção de Santana e da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico de Osasco/SP e Jundiaí/SP.
[1] Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
[2] “Art. 4º Esta Lei não se aplica ao tratamento de dados pessoais:
I - realizado por pessoa natural para fins exclusivamente particulares e não econômicos;
II - realizado para fins exclusivamente:
a) jornalístico e artísticos; ou
b) acadêmicos, aplicando-se a esta hipótese os arts. 7º e 11 desta Lei;
III - realizado para fins exclusivos de:
a) segurança pública;
b) defesa nacional;
c) segurança do Estado; ou
d) atividades de investigação e repressão de infrações penais; ou (...)”.